sábado, 10 de outubro de 2009

O moderno setor agropecuário brasileiro, segundo o IBGE

Editoria  (Alerta em Rede) – 10 October, 2009 19:59

Finalmente, dez anos após o último levantamento feito, emerge o novo retrato da agropecuária brasileira consolidado no Censo Agropecuário 2006 do IBGE. Os números mostram um setor rentável, dinâmico, usuário de tecnologia intensiva, de alta produtividade e com menos oportunidades de emprego.


O novo censo incorporou o inédito conceito de agricultura familiar, o que gerou críticas de dirigentes ruralistas em razão de uma eventual distorção sobre qual ramo do agronegócio (familiar ou empresarial) geraria mais benefícios ao país, mas rendeu comemorações no Ministério do Desenvolvimento Agrário. [1]

A CNA (Confederação Nacional da Agricultura), por exemplo, considera que a análise dos dados relacionados à Agricultura familiar pode ter gerado distorções pois um estabelecimento não pode ser considerado como uma unidade familiar, dado que o mesmo produtor poderia ser contado mais de uma vez. A CNA avalia que o aumento da concentração demonstra que a política agrária do governo não tem gerado resultados.

O valor total dos bens em mãos do setor rural atingiu R$ 1,24 trilhão em 2006, mostra o IBGE. Quase 71% desse patrimônio estava imobilizado em terras. Instalações e benfeitorias (9,3%), animais (8%), máquinas (6,4%) e matas (2%) completavam os ativos dos produtores rurais. A terra ainda é importantíssima para a formação do patrimônio rural, afirma o coordenador-geral de planejamento estratégico do Ministério da agricultura, José Garcia Gasques.

Em 2006, a rentabilidade da agropecuária brasileira foi, de acordo com analistas, de 18% do valor da produção. A renda líquida, resultado da subtração de despesas sobre o valor total da produção, atingiu R$ 32,5 bilhões no ano da pesquisa.

O novo censo evidencia um nível de endividamento superior a 18% do valor da produção, sobretudo com instituições financeiras. No total, 1 milhão de estabelecimentos rurais deviam R$ 26,8 bilhões em 2006. Os mais endividados estavam no Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Paraná e São Paulo. 34% das despesas totais de R$ 111,3 bilhões dos produtores estavam concentradas na aquisição de insumos (adubos, corretivos, sementes e agrotóxicos). Além disso, a pesquisa mostra que 9,5% das receitas totais das propriedades vêm de salários obtidos fora das fazendas ou de aposentadorias e pensões.

De 1996 a 2006, mostra o censo que as lavouras de soja e cana têm avançado sobre pastagens naturais, o que concentrou o valor total da produção no ramo vegetal (77%). Mas, nesses últimos dez anos, houve também um forte crescimento na criação do gado bovino, sobretudo em Estados da Amazônia, onde os preços da terra são mais baratos. O rebanho chegou a 171,6 milhões de cabeças. Ao mesmo tempo, a agropecuária reduziu em 23 milhões a área ocupada, em boa medida cedida a novas unidades de conservação e terras indígenas. Em 2006, foram 330 milhões de hectares. Há dez anos, eram 353,6 milhões.

O minucioso levantamento do IBGE dá números a algumas conhecidas mazelas do setor. A grande maioria dos produtores entrevistados em 2006 eram analfabetos ou sabiam ler e escrever, mas não tinham frequentado a escola (39%) - 43% deles não possuíam o ensino fundamental completo, totalizando mais de 80% de produtores rurais com baixa escolaridade.

Por outro lado, o porcentual de estabelecimentos agropecuários do País que possuíam energia elétrica saltou de 39% para 68% em 10 anos, segundo a sondagem. Nesse período, o maior aumento ocorreu na Região Nordeste, passando de 19,9% para 61,5%, chegando a 1,5 milhão de estabelecimentos rurais.

Segundo o economista e ex-ministro Delfim Netto, a “agricultura (o chamado agronegócio) é um dos setores mais competitivos da economia brasileira”, mas tem sido estressado

1º) pela centralização das decisões da política ambiental; 2º) pelo estímulo que se dá às organizações não-governamentais (que recebem subsídios escondidos dos governos brasileiro e estrangeiros), que perturbam os mecanismos da própria reforma agrária; e 3º) pela construção de duvidosíssimos "índices de produtividade".

Ninguém pode ser contra a política de preservar (e melhorar!) o meio ambiente, mas ninguém pode ignorar que é impossível uma política "centralizada" para um país de 8,5 milhões de quilômetros quadrados e dominado por vários biomas. Ninguém defende a extinção das ONGs, mas não se pode admitir que o "não-governamental" se sustente, direta ou indiretamente, de "governos" (nacional ou estrangeiros). Ninguém pode ser contra o estabelecimento de "índices mínimos de produtividade", mas não se pode ignorar a imprecisão do conceito e o risco de seu uso político. [2]

Já para o deputado, engenheiro agrônomo e produtor Luis Carlos Heinze (PP-RS), a imensa complexidade que é produzir alimentos no Brasil vai muito além do IBGE e, para entender-se melhor o assunto, é preciso um pouco de história, a começar no final dos anos 80, após a rodada do Uruguai e do Gatt, quando o mundo decidiu eliminar os subsídios:

Alguns países seguiram a decisão, outros não. Estados Unidos, China, Japão, Índia e os da Europa continuaram subsidiando e não interromperam a prática. Todos os anos esses países aplicam US$ 400 bilhões em subsídios. Mais de 50% da renda rural dos produtores norte-americanos é bancada pelo governo.

No Brasil, dos anos 80 até hoje, os preços reais recebidos pelos produtores de grãos, fumo, fibras, carnes e lácteos, atualizados pelo IGP-M da FGV até agosto de 2009, caíram em torno de 60%. O mercado de defensivos, fertilizantes, diesel, grãos, máquinas (tratores e colheitadeiras) é altamente cartelizado. A carga tributária brasileira passou de 20% do PIB em 1980 para 36% em 2009. O produtor, quase sempre, não consegue repassar a diferença no preço do que produz. Bem diferente lá de fora, com a prática do subsídio. [..]

Talvez não conste no IBGE, mas, nos últimos 15 anos, o arroz teve apenas sete anos de preços positivos e o trigo apenas dois. Enquanto discutimos o óbvio, os suinocultores independentes estão perdendo de R$ 60,00 a R$ 70,00 por suíno produzido. Os criadores de gado de leite estão pagando para produzir, e o balde já está, literalmente, derramando na fazenda. As assimetrias do Mercosul não constam no IBGE. Mas aí está um problemão, que merece bem um capítulo à parte, pois ele foi mais um funil posto acima da cabeça do produtor”. [3]

Notas:
[1]Novo censo do campo comprova avanços e expõe velhas mazelas, Valor, 01/10/2009
[2]De mendicante a senhor, Folha de São Paulo, 30/09/2009
[3]Muito além do IBGE, Correio do Povo, 05/10/2009

Link Original: http://www.alerta.inf.br/agropecuaria/1571.html

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